No próximo final
de semana em São Paulo, vai acontecer mais uma edição da Marcha para Jesus.
Este evento espalhou-se pelo Brasil de forma gradativa e hoje faz parte do
calendário de várias cidades.
No Brasil, o
evento começou a ser realizado em terras Pauliceias no ano de 1993, organizado
pela Igreja Renascer em Cristo através de seus líderes, o “Apóstolo” Estevão
Hernandes e “Bispa” Sônia Hernandes, ambos conhecidos internacionalmente
após sérios problemas com a justiça brasileira e americana, em
razão de suas respectivas infrações contravencionais. Além disso, são
conhecidos por serem expoentes do neopentecostalismo, bem como por pregar as
perniciosas doutrinas da restauração apostólica triunfalista e teologia da
prosperidade.
Há muitos anos,
este evento vem sendo questionado por muita gente, em decorrência de ser
organizado por uma única denominação com pessoas duvidosas à frente, bem como
pelas práticas e resultados negativos de tais manifestações públicas.
Antes de qualquer
análise, é importante salientar a origem de tais eventos. O modelo original da
Marcha para Jesus que a Igreja Renascer copiou é tão questionável quanto a
existente em nosso país. Aliás, infelizmente no Brasil já é tradição a
importação de movimentos controversos de outros países.
O conceito “Marcha
para Jesus” começou na Inglaterra em meados de 1987, através de uma
ação ecumênica entre protestantes e católicos de Londres. A organização foi
iniciativa dos líderes carismáticos Britânicos Gerald Coates, Roger Forster,
Lynn Green e Graham Kendrick. Segundo eles, a passeata pública foi feita para
demonstrar a “unidade entre a Igreja” e expressar a fé cristã para a sociedade,
bem como promover atos proféticos de batalha espiritual contra espíritos
territoriais malignos, dominantes da Europa secularizada.
O que muitos não
sabem é que estes líderes britânicos são adeptos de práticas neopentecostais
controvérsias e de conceitos antibíblicos. Para se ter uma idéia, um dos
idealizadores da Marcha é Gerald Coates, famoso carismático liberal Britânico,
que tem como referência nada menos que Rodney Howard-Browne, Benny Hinn e
Kenneth Copeland.
Coates nega
abertamente a inerrância e suficiência das Escrituras, defende a benção de
Toronto e o derramamento de Pensacola como “mover” do Espírito Santo, utiliza como fontes de ensino a espiritualidade Celta, além de
emitir falsas profecias e apoiar falsos profetas como Paul Cain.[1] Lynn Green
é um carismático ecumênico que defende a unificação doutrinária das religiões
monoteístas, principalmente entre católicos e protestantes.[2] Roger Forster é
um carismático controverso, árduo defensor da batalha espiritual e da luta
contra espíritos territoriais malignos, através de atos proféticos e outras
práticas místicas.[3] Por fim, Graham Lendrick é um ministro de louvor
carismático, autor de músicas com letras teologicamente questionáveis, também
defende o ecumenismo, a benção de Toronto e é adepto da confissão positiva.
Com estas
informações, podemos ter uma ideia do que conceitua-se a original Marcha para
Jesus. Entretanto, no Brasil o problema é muito mais grave.
Como todo ano, o
evento reúne diversas denominações evangélicas, reunidas em uma grande
procissão pelas ruas da capital paulistana. Mas qual o objetivo desta Marcha
para Jesus no Brasil?
Segundo o
“presidente” da Marcha para Jesus, “Apóstolo” Estevam Hernandes, “a Marcha Para Jesus não foi criada para exaltar nenhum homem, é a
expressão do mover do Espírito Santo e um ato proférico!“(sic).[4]
Frase contraditória, pois se Estevam é o presidente da Marcha para Jesus,
automaticamente o mesmo será exaltado de alguma forma! Ora, presidente é aquele
que exerce uma liderança máxima, que ordena, que delega, que dá a palavra final
e que sanciona. Nem mesmo os líderes de outras denominações presentes na marcha
possuem autoridade sobre o evento, quem dá as cartas é o líder da Renascer.
Além do mais, todos sabem que os discípulos da Igreja dos Hernandes “lutam e
morrem” por eles, tendo em vista o famoso jargão popularizado na época da
prisão dos líderes da Renascer: “Espada pelo Apóstolo e pela
Bispa!”
A justificativa
para o “fundamento espiritual” do evento é pior ainda, vejamos:
“A Marcha tem como fundamento bíblico as passagens de Êxodo 14,
Josue 6 e João 13:35 [...]Todos os anos, a Marcha para Jesus têm revelado – em
âmbito mundial – o poder e a misericórdia de Deus aos homens. Milhares de
pessoas são curadas, libertas e restauradas.”[5]
Francamente, citar
passagens do Antigo Testamento não justifica a realização da Marcha para Jesus.
As “marchas” do povo Hebreu não tinham como alvo evangelizar ou curar, mas eram
marchas de guerra, para conquistar povos ou exterminar inimigos, conforme a
vontade de Deus naquela época. No Êxodo, o que ocorreu foi um livramento específico
de Deus para com o povo Hebreu e não uma procissão evangelística. É totalmente
antibíblico alegorizar tais passagens Veterotestamentárias como se o povo
Israelita estivesse marchando para fora do Egito e para Canaã, de caras
pintadas, com bandeiras e faixas, os levitas fazendo shows gospel com seus
respectivos instrumentos, com o objetivo de “ganhar” para o Deus de Israel os
egípcios e os cananeus!
Imaginem então,
tomar de forma literal o texto de Josué 6 para os dias de hoje! Já que é para
literalizar o texto, então os “marchadores” devem também tocar trombetas,
marchar em volta da cidade sete vezes (não somente uma dentro da cidade), ficar
silenciosos (sem trios elétricos, sem gritos e sem triunfalismos) nas seis
primeiras voltas e só gritar na sétima.
O interessante é
que não vemos em nenhum lugar no Novo Testamento a ordem evangelística de
marchar para Jesus, ou no Antigo Testamento para Deus, muito menos nas
literaturas dos pais da Igreja, reformadores, missionários e evangelistas por
toda a história. Não há, absolutamente, nenhum fundamento espiritual cristão
para se praticar marchas evangelísticas. Na verdade, eu não consigo imaginar
como alguém pode se converter em um evento como este.
Além do
“presidente” da Marcha para Jesus em destaque, também são destacados os trios
elétricos que puxam a “micareta gospel”, ao som de músicas triunfalisticamente
antropocêntricas, preparadas cuidadosamente para massagear o ego dos
participantes em detrimento do evangelho que confronta o caráter. Uma
“musicalidade” com direito ao melhor do gospel atual: funk, axé, pagode e até
reggaeton! Aí eu pergunto: A conversão vem através do ato de levantar a mão e
ir até a frente do trio em resposta a um apelo feito neste ambiente? É no
mínimo questionável esse tipo de evangelismo, pois a palavra quase não é
proclamada devido ao foco na euforia festiva, salvo raras exceções quando é
falada ou cantada, mas de maneira superficial e distorcida, onde não há
entendimento profundo das Escrituras.
Por falar em trio
elétrico, muitos vêem os mesmos como uma grande oportunidade de promover seus
interesses particulares. Afinal, trata-se de um evento com participação popular
de mais de três milhões de pessoas em média. A ocasião é perfeita para os
manipuladores de massa de manobra, principalmente políticos, dos quais com
certeza vão aproveitar a véspera de ano eleitoral para articular alianças com o
“povo gospel”.
O que falar do
misticismo, dos atos proféticos, do triunfalismo apostólico exclusivista e das
profetadas que nunca se cumprem, dentre outros absurdos que testemunhamos todos
os anos nesses eventos? Em 2008, eu postei no meu blog alguns atos antibíblicos
praticados na respectiva marcha. Pessoas anotavam pedidos e dificuldades num
papel, colocavam o mesmo dentro dos calçados com o intuito de “marchar” em cima
para quebrar as maldições escritas no papel, profetizando a conquista de seus
recpectivos pedidos (veja aqui). Ou seja, um ambiente neopentecostal,
antropocêntrico em sua essência, onde é potencializada as mais variadas
práticas místicas e antibíblicas que se pode inventar.
Posto isso,
infelizmente concluo que a Marcha para Jesus no Brasil tornou-se num evento com
quatro objetivos principais:
1 – Competir com a
“marcha do orgulho gay” em termos numéricos;
2 – Servir como trampolim para promoção de cantores, líderes e políticos “gospel”;
3 – promover o comércio milionário de produtos/serviços gospel;
4 – Ser um transtorno para a ordem da cidade, por conta da perturbação do sossego público e do bloqueio ao trânsito, afastando as pessoas do evangelho, bem como envergonhando os cristãos que não compactuam com o evento.
2 – Servir como trampolim para promoção de cantores, líderes e políticos “gospel”;
3 – promover o comércio milionário de produtos/serviços gospel;
4 – Ser um transtorno para a ordem da cidade, por conta da perturbação do sossego público e do bloqueio ao trânsito, afastando as pessoas do evangelho, bem como envergonhando os cristãos que não compactuam com o evento.
O meu desejo é que
o povo acorde de toda essa utopia prisional, que Cristo não seja utilizado como
cabo eleitoral de algum político e que o cristianismo deixe de ser um trampolim
para o sucesso de alguém. Marchemos pela ética evangélica brasileira!
Por Ruy Marinho
Notas:
1 – Para saber mais sobre quem são os fundadores da Marcha pra Jesus em
Londres, veja estes links: http://op.50megs.com/ditc/coates.htm , http://www.christian-witness.org/archives/van1997/gcoates_1.html e http://www.christian-witness.org/archives/cetf1998/brotherandrewdoor.html
2 – Ibid.
3 – Ibid.
5 – Ibid.